Desde as eleições presidenciais, uma das frases que mais ouço é: “Porque o Brasil investiu na construção de um porto em Cuba e não investe em infraestrutura aqui?”. A pergunta pode parecer óbvia, e a grande maioria das pessoas deve fazer o mesmo questionamento. Na verdade são naturais perguntas de senso comum, com críticas comuns, padronizadas, estereotipadas sem muito estudo sobre o tema. Existem outras perguntas simplistas que costumam rechear as mesas dos bares pelo País, como “Porque não vendemos o craque do time e pagamos três bons jogadores?” ou ainda “Se a casa da moeda fabrica dinheiro, porque não fabrica mais dinheiro e o Brasil passa a se tornar um País milionário?”.
Sim, as perguntas são simples, já as respostas nem tanto. Ao contrário do que imaginam investimentos em Cuba não começaram com o atual governo, dito socialista e que na teoria tem afinidades ideológicas com países como Cuba. A prática já ocorre há muito tempo, o governo do Fernando Henrique Cardoso, por exemplo, investiu também em Cuba e na Venezuela. Por questões também ideológicas, o brasileiro tem alguns problemas com Cuba que não entendo bem, talvez reflexo da Guerra Fria e da colônia cultural estadunidense que se tornou ao longo dos anos. Bastou falar a palavra “Cuba” para começarem os conflitos.
A presidenta Dilma Rousseff se encontrou com o primeiro ministro da Grécia, George Papandreou, para discutir possíveis investimentos nos setores de energia e turismo, segundo fontes do próprio governo grego. Claro, investimentos na Grécia talvez não mexam com o ego do brasileiro e por isso passam despercebidos, mas a temática é a mesma: Por que investir na Grécia? – A resposta a essa e outras perguntas pode ser dada através de investimentos privados em países de menor economia, como a que a Marcopolo fez criando uma fábrica no México, ali o objetivo era estratégico, mão de obra mais barata, menor investimento e acesso ao mercado americano.
Assim como fez a empresa de ônibus, o investimento brasileiro em Cuba é estratégico. Cingapura também investe em Cuba com o mesmo objetivo. O porto de Mariel é considerado tão sofisticado quanto os maiores terminais do Caribe, Kingston (Jamaica) e de Freeport (Bahamas), e ao final de sua ampliação terá capacidade para receber navios de carga do tipo Post-Panamax, que transitarão pelo Canal do Panamá. A obra que foi realizada pela Odebrecht em parceria com a empresa cubana Quality, custou U$ 957 milhões, sendo U$ 682 milhões financiados pelo Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Apesar do alto investimento, o mesmo já deu retorno direto e indireto para o Brasil, visto que U$ 802 milhões investidos na obra foram gastos no Brasil, através da compra de bens e serviços. Segundo informações oficiais da Odebrecht, este valor gerou 156 mil empregos diretos, indiretos e induzidos no País, sem falar nas vagas geradas em Cuba para profissionais estrangeiros.
Independente do retorno já gerado, o Brasil tem interesse em ser o principal parceiro econômico de Cuba, já que as exportações brasileiras para a ilha quadruplicaram na última década, chegando a U$ 450 milhões. O porto de Mariel é o mais próximo da Flórida, a menos de 150 quilômetros do maior mercado do mundo, o dos Estados Unidos. O embargo americano não se sustentará por muito mais tempo e, o porto será extremamente estratégico para empresas brasileiras, devido sua localização. A proximidade com o novo Canal do Panamá também é um fator a se considerar, para chegada aos mercados situados no Pacífico. Em torno dele surgirá uma zona econômica especial, voltada basicamente para exportações, onde ao contrário do restante de Cuba, as empresas poderão ter capital 100% estrangeiro.
O grande risco do investimento feito é a possibilidade de Cuba não assumir a dívida com o BNDS e alegar soberania nacional tomando para si 100% da gestão do porto de Mariel. Algo parecido com o que fez a Venezuela com a refinaria da Petrobras em seu território. Até o momento, Cuba permanece em dia com o Brasil, vinculando os pagamentos diretamente às receitas obtidas pelo porto. Vale ressaltar que isso não elimina a importância da Polícia Federal e do Ministério Público de investigarem a legalidade dos empréstimos concedidos pelo BNDS a empreendimentos em países como Cuba, Venezuela, Equador e Angola, e menos ainda dos investimentos e parcerias público privadas para a infraestrutura nacional.