Kindle paperwhite: Prático como você

A carta

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A quarta-feira amanhecera com o céu nublado e um vento frio. Mesmo sendo um dia útil, Roberto estava de folga. Acordou um pouco mais tarde e não viu quando sua esposa saiu para trabalhar. Tomou um copo de leite gelado e comeu alguns biscoitos. Saiu pelo quintal para pegar o jornal do dia. Ainda com cara de sono, abriu a caixa de correioe se deparou com o jornal e uma carta remetida em seu nome. “Que engraçado, quem ainda manda cartas nos dias de hoje?” Não havia o nome do remetente, apenas o endereçado.

Sentou no sofá, ligou a TV e começou a ler o caderno de esportes, sem dar muita importância à carta que estava sobre a mesa. Viu as principais manchetes e zapeou por alguns canaisaté que entediado resolver rasgar o envelope e ler a carta, que curiosamente, estava escrita à mão.

Você não me conhece, nunca me viu por aí ou esbarrou comigo pelas ruas da Cidade. Deveríamos ser completos desconhecidos, se não fosse por um único detalhe: Eu sei muito bem quem é você. Demorei alguns anos para lhe escrever, me peguei em diversos momentos com a dúvida se deveria ou não mandar-lhe essa carta. A vida muda a cada instante, o tempo invariavelmente passa, e deixamos escorrer por entre os dedos as oportunidades de sermos felizes.

Hoje a mulher que aquece a sua cama, já aqueceu a minha um dia e, todas as manhãs, me lembro como se fosse hoje, de quando ela me sorria ao abrir os olhos ao meu lado. Não poderia negar que sonho todos os dias com o instante em que esse momento poderia se repetir. Sim, eu sei, ele não vai, mas ainda assim, o que me custa sonhar com os momentos que me fizeram tão feliz?

Cada sorriso que ela me endereçava, era como um quadro de Monet retratando a mais bela paisagem que meus olhos pudessem admirar. Ainda hoje me deparo com o brotar de lágrimas em razão da lembrança de seu sorriso.    Como pude ser tão tolo? Como pude deixar passa a oportunidade de ser feliz para todo o sempre com a mulher da minha vida?

Cada vez que fazíamos amor era como se Deus me concedesse a dádiva da imortalidade. Nossas almas se confundiam em um só ser. Sua boca carnuda alimentava o desejo de meus lábios, enquanto o êxtase de meu corpo inundava a matéria que dava forma a mais bela das mulheres que já passaram por este Universo.

Ah o Universo! Tenho a certeza de que Deus criou o Universo para que cada parte deste mundo que conhecemos possa ao menos uma vez sentir o amor que senti e vivi por ela.

A vida se tornou um vazio, um oco, um buraco negro, sem nada, sem ar, sem vácuo, sem espírito. Eu apenas vivo, sobrevivo por entre as sombrias vielas do tempo, na esperança de que um milagre possa me conceder o direito de retornar, voltar ao exato momento em que a perdi, para tentar consertar o que não tem mais remédio.

Sou um arremedo do homem que já fui, definhando pelas ruas, esperando somente o instante em que meu tempo chegará ao fim, com a certeza de que falhei. Falhei quando não consegui manter ao meu lado a mulher que o destino me trouxe, mas se esqueceu de me entregar o manual de como mantê-la por perto, e sem ao menos contar sobre o futuro trevoso que me aguardava sem ela.

Como posso respirar se o ar que ela exala não invade mais os meus pulmões? Como pode meu peito bater se ela não mais recosta para adormecer, deixando meu braço dormente, que nem por um segundo me permitia movê-lo para não acorda-la?

Meu coração hoje bate somente de forma involuntária. Não há mais razão real para fazê-lo. Quando a perdi, tudo se foi, perdi não só minha metade, como a seiva necessária para manter o brilho que meus olhos não mais carregam.

Quando olhar para o lado nas próximas manhãs, pense sempre no que lhe escrevi, valorize cada sorriso, para que um dia não se torne o ser vazio e infeliz que me tornei ao perder a mulher da minha vida.

Roberto sentiu profundamente o lamento do homem, pousou a carta por sobre a mesa e ficou por alguns minutos pensando no que ali estava escrito. Decidiu por jogar fora o que havia lido para que ela não descobrisse todo o sentimento que aquele homem ainda nutria.

Enquanto olhava para o olhar de sua esposa na fotografia em um porta-retratos, chegou à conclusão de que era apenas uma questão de tempo.

Ele também a havia perdido…

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Sobre Rodrigo Barros

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Empreendedor e escritor, Rodrigo Barros é bacharel em Biblioteconomia e em Sistemas de Informação, com pós-graduação em Gerência de Projetos e MBA em Gestão de Marketing. Fundador e editor chefe na Cartola Editora.

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