Aquele parecia ser mais um dia comum. Gabriela se preparava para descer para o recreio quando Pedro passou por sua mesa e deixou um bilhete dobrado. “O que poderia ter escrito ali?”, pensava a menina. Não que Gabriela fosse feia, longe disso, era uma das meninas mais interessantes da escola, mas com apenas doze anos, sabia que seria um tanto surreal chamar a atenção de um rapaz mais velho e tão popular como Pedro. Sem que ninguém percebesse e com o coração saindo pela boca, a menina abriu vagarosamente o bilhete a fim de descobrir o que poderia ter escrito o rapaz que tanto a encanta.
“Hoje, após o recreio, me encontre na escada para o terceiro andar.”
Ela não sabia o que fazer, suando frio, mal conseguia raciocinar. Encontrar com Pedro pelos corredores da escola, sem que ele ao menos lhe dirigisse um único olhar já a deixava nervosa, imagina encontrá-lo para qualquer tipo de conversa? O tempo parecia não passar, os ponteiros do relógio não andavam. Já não tinha mais lápis suficiente para apontar enquanto esperava a hora do recreio chegar. O que dizia a professora durante a aula não tinha a menor importância, e ainda que tivesse, não poderia ser processado por Gabriela.
Enfim o sinal tocou. A menina franzina desceu para o pátio e avistou Pedro de longe, que acenou a cabeça em sinal de positivo. Era a primeira vez que ele demonstrava qualquer atitude em relação à menina. Gabriela foi à cantina comprar um lanche e deixou cair umas moedas de tão nervosa que estava. Comeu um salgado e tomou uma Coca-Cola, que lhe ajudou a refrescar a garganta seca. O intervalo chegou ao fim e Pedro, ao lado de seus amigos, continuava olhando a menina como se dissesse “chegou a hora”. Gabriela entendeu o recado e seguiu em direção às escadas, como se fosse retornar à sala de aula.
A escada não tinha muita iluminação e no ponto exato em que estava aguardando o rapaz, nenhuma câmera de segurança poderia registrar aquele instante, o que a deixava, de certa forma, mais segura.
Pedro chegou e disse “oi”, demonstrando um pouco de hesitação. O que Gabriela poderia dizer? Que ele era o rapaz mais bonito da escola? Que sonhava com aquele momento todos os dias? Todas as mulheres que um dia tiveram doze anos sabem exatamente o que se passava na cabeça e no coração da menina, naquele instante. Mesmo que a vontade fosse de dizer-lhe tudo que sentia, a única coisa que disse foi:
– Por que me chamou aqui? – balbuciou com certo ar de indignação e “perda de tempo”.
Pedro sorriu. “Mas que menina invocada”, pensou. Sem muitas explicações, o rapaz pegou em sua mão, olhou em seus olhos e disse: – Eu quero um beijo seu. Só isso.
A menina não sabia o que dizer, ou como agir, e apenas lhe negou tal momento, tentando subir as escadas em velocidade para que pudesse fugir do beijo que até então era o mais desejado. Pedro segurou Gabriela pelo braço e a trouxe de supetão ao encontro de seu peito, o coração da menina batia forte, Pedro podia sentir dentro de seu próprio corpo, o pulsar de Gabriela. O rapaz tocou-lhe o rosto e suavemente seus lábios, no primeiro beijo que a menina recebia em sua vida.
Um turbilhão se sensações: Medo, pavor, euforia, alegria. As pernas estavam trêmulas, um frio gelado lhe percorria a espinha. Rapidamente conseguiu se afastar do rapaz e novamente subir as escadas de forma rápida, fugindo do que agora lhe era inevitável.
Pedro seguiu atrás de Gabriela e pediu: – Espera! – Mas ela não lhe deu ouvidos, subia rapidamente em direção à sala de aula, e em um último instante olhou para trás.
Ele lhe perguntou:
– Posso te beijar de novo outra hora?
Gabriela sorriu e respondeu:
– Quem sabe?
De fato, a resposta que vinha em sua cabeça era:
“Amanhã, depois, e mais uma vez no dia seguinte, e assim por diante, até meus lábios descascarem de tanto tocarem os seus”.